![Poluição ambiental devido à guerra](https://revistabioika.org/assets/multimedia/docs/es/artes/angela.gutierrez@revistabioika.org/thumbs/20231221184531-contaminacion-por-la-guerra-m.jpg)
O impacto cruel e devastador das guerras não tem dado à humanidade tempo para enxergar além dos efeitos nas populações humanas, seja em termos de perda de vidas, deslocamento forçado, danos à infraestrutura urbana principalmente hospitalar, escassez de alimentos, entre outros. No entanto, a guerra tem também um efeito catastrófico na natureza, tornando-a uma vítima adicional dos conflitos armados.
Nesse sentido, podemos identificar inúmeros impactos ambientais, como a contaminação de fontes de água, solo e ar; destruição de ecossistemas, cultivos e florestas; morte em massa de animais; aumento da pressão sobre os recursos naturais devido ao deslocamento forçado de grupos humanos; redução do controle no uso de espécies da fauna por parte das autoridades ambientais, favorecendo o tráfico e a sobreexploração; e alteração dos padrões de migração da fauna em resposta às ações militares. Esta situação é agravada porque milhões de pessoas dependem dos serviços ecossistêmicos que provêm do meio ambiente para garantir seus modos de vida.
![Tanque de guerra](https://revistabioika.org/assets/multimedia/docs/pt/artes/anielly.oliveira@revistabioika.org/thumbs/20231221163530-tank-1063755-1280-m.jpg)
No âmbito dessa necessidade recente de consciência global que exige considerar o meio ambiente como uma vítima da guerra, em 2001, a Organização das Nações Unidas declarou o dia 6 de novembro como o "Dia Internacional para a prevenção da exploração do meio ambiente em guerras e conflitos armados". Posteriormente, em 2016, a Assembleia das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente reconheceu oficialmente que a existência de ecossistemas saudáveis e a gestão sustentável dos recursos naturais reduzem a possibilidade do surgimento de conflitos armados1.
Esta iniciativa se alinha com o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que buscam garantir o bem-estar da humanidade em harmonia com a natureza. Apesar de apenas o objetivo 16 "Paz, justiça e instituições sólidas" se referir explicitamente a este tema, é evidente que praticamente a totalidade dos objetivos está relacionada com o seu cumprimento2.
Neste contexto, o Direito Internacional Humanitário (DIH)3, que regulamenta a conduta dos Estados e atores armados durante o desenvolvimento da guerra, pauta-se por princípios fundamentais cujo propósito é proteger a dignidade humana. Nessa perspectiva, entre os princípios que contemplam a proteção do meio ambiente estão: 1) a proteção de bens civis e culturais, mediante a proibição de ataques a instalações de água, usinas elétricas e áreas de importância cultural; 2) a proporcionalidade nos métodos e meios de guerra que possam causar danos extensos, duradouros ou graves ao meio ambiente; 3) proteção de áreas naturais e espécies ameaçadas de extinção; 4) controle dos efeitos da poluição, mediante a proibição de armas que possam liberar substâncias tóxicas; 5) proteção de objetivos específicos, que obriga a distinguir entre objetivos militares e civis.
Com tudo isso dito, proteger o meio ambiente implica pensar além da fase ativa da guerra. É necessário considerar o período pós-guerra para a reconstrução moral, social e econômica da sociedade, pois é uma etapa em que a biodiversidade pode representar uma oportunidade vital para mitigar os efeitos do conflito, impulsionando um início efetivo e sustentável da recuperação dos modos de vida das populações afetadas. Isso, baseado na identificação de todos os cidadãos como parte da natureza e dependentes de sua integridade para o restabelecimento do bem-estar das comunidades humanas envolvidas no conflito4.
![Pântano de Syra Pohonia](https://revistabioika.org/assets/multimedia/docs/pt/artes/anielly.oliveira@revistabioika.org/thumbs/20231221163530-b7a8d55-m.jpg)
No decorrer dos últimos anos, entre outros numerosos conflitos bélicos ativos no mundo (pelo menos oito até o final de 20235), ao longo dos últimos anos, entre vários conflitos bélicos ativos no mundo (pelo menos oito se encerrando neste 2023), testemunhamos o protagonismo midiático de duas guerras que impactaram o planeta de maneira desastrosa. A guerra entre Rússia e Ucrânia que já deixa milhares de vítimas humanas fatais, milhões de pessoas deslocadas e numerosos danos ambientais que incluem a contaminação da água, solo e ar, assim como a destruição de ecossistemas. Mais recentemente, testemunhamos de maneira impotente o conflito entre Israel e Hamas, localizado na Faixa de Gaza, que resultou no assassinato e deslocamento de milhares de civis, principalmente crianças. Por outro lado, observamos o dano ambiental consequente gerado principalmente no território palestino, devido à destruição de terras e cultivos, perda de biodiversidade, assim como o controle e contaminação de fontes hídricas por parte de Israel, comprometendo a segurança alimentar de milhares de pessoas a curto e médio prazo6.
![Deslocamento forçado causado pela guerra](https://revistabioika.org/assets/multimedia/docs/es/artes/angela.gutierrez@revistabioika.org/thumbs/20231221184531-desplazamiento-forzado-m.jpg)
Hoje, em pleno 2023, apesar de a humanidade ter desenvolvido um quadro legal mundial para a regulamentação de conflitos bélicos, buscando garantir o respeito pelos direitos humanos dos civis e do meio ambiente, continuamos lamentando a morte de milhares de pessoas indefesas e a destruição massiva do meio ambiente, sem que pareça haver alternativas para deter a barbaridade.
O impacto da guerra sobre o meio ambiente transcende a perda de biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos7 a ela associados. As mudanças ambientais resultantes da guerra modificam as dinâmicas sociais, pois a interação entre as pessoas e o entorno é alterada. Por exemplo, rituais e receitas tradicionais precisam ser adaptados, uma vez que certas espécies ou recursos específicos podem não mais ser encontrados. Consequências mais graves podem ser observadas em alguns conflitos, como a dificuldade no acesso à água potável, ar limpo e a garantia da soberania e segurança alimentar. Sobretudo esta última, relacionada com garantir a alimentação de milhões de pessoas em regiões de conflito ou afetadas por mudanças climáticas, constitui uma das maiores preocupações em nível global. Apesar das dificuldades, comunidades em nível local e regional buscam caminhos e alternativas para produzir alimentos e garantir o bem-estar das populações humanas, em harmonia com a natureza.
![Broto em meio à destruição](https://revistabioika.org/assets/multimedia/docs/pt/artes/anielly.oliveira@revistabioika.org/thumbs/20231221163530-plant-8338691-1280-m.jpg)
Por essas razões, nesta décima edição da Revista Bioika, compartilhamos conteúdos relacionados à produção sustentável de alimentos, voltados tanto para a agricultura quanto para a pecuária, assim como a importância de discutir esses conhecimentos com a sociedade em geral. Esperamos que seja uma oportunidade de análise crítica e reflexão sobre as causas políticas, econômicas, ecológicas e culturais dos conflitos socioambientais, bem como sobre as possibilidades que temos de impulsionar um mundo mais solidário e sustentável. Como sempre, bem-vindos e bem-vindas a este espaço digital de discussão sobre as problemáticas regionais que vivemos em nosso continente.