Testando a eficiência de áreas protegidas para a conservação de tartarugas de água doce na amazônia brasileira

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Um exemplo de como a correta seleção de um área de proteção, oferece melhores resultados de conservação de tartarugas aquáticas amazônicas.

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Filhote de <em>Podocnemis expansa</em>

A Amazônia possui um grande número de espécies de fauna e flora, sendo uma área de extrema importância para a conservação da biodiversidade. Uma ampla proporção da bacia Amazônica já foi desmatada e a perda desses ambientes contribui para o declínio da fauna. Uma estratégia de conservação para diminuir impactos das atividades humanas é a criação de Áreas Protegidas (AP), incluindo Áreas de Proteção Integral (API), onde é proibido o uso da biodiversidade, Áreas de Uso Sustentável (AUS), onde populações tradicionais utilizam a biodiversidade de forma sustentável e Terras Indígenas (TI). O conhecimento da distribuição de espécies é uma característica essencial para definir áreas prioritárias à sua conservação, mas essa informação é escassa em áreas tropicais de grande diversidade. Nesse contexto, modelos matemáticos que preveem a distribuição de espécies em áreas não amostradas são ferramentas úteis para fortalecer ações de conservação. Tais modelos relacionam os locais de ocorrência das espécies com variáveis ambientais para prever outras áreas geográficas ambientalmente adequadas à sua ocorrência, o que chamamos de distribuição potencial.

O conhecimento da distribuição é uma característica essencial para definir áreas prioritárias à sua conservação, mas essa informação é escassa em áreas tropicais de grande diversidade.

Camila Kurzmann Fagundes

O conhecimento sobre padrões de distribuição de tartarugas e a contribuição das AP na sua conservação é importante, uma vez que o grupo está entre os vertebrados mais ameaçados: 52% das espécies estão em alguma categoria de ameaça, principalmente devido a exploração humana e a perda de habitat (Figura 1). Na Amazônia, esses organismos são um recurso alimentar de grande importância. A porcentagem da distribuição de cada espécie que deve sobrepor à rede de AP para que esta seja considerada protegida foi definida de acordo com a sua extensão de ocorrência. Espécies com distribuição restrita (< 1000 Km2) deveriam ter toda sua distribuição dentro das AP, enquanto espécies de ampla distribuição deveriam ter entre 10% e 100% da sua distribuição em AP. Foram analisados três cenários de conservação (Figura 1): 1- considerando somente API, 2 – considerando API+AUS e 3 – considerando API+AUS +TI.



O número de espécies de tartarugas de água doce foi maior na porção sedimentar da bacia Amazônica, na drenagem do Rio Amazonas/Solimões e do Rio Negro, constituindo importantes áreas para a conservação do grupo. Apesar do grande número de AP na Amazônia brasileira, nós encontramos notáveis lacunas na proteção de tartarugas de água doce. Nossos resultados evidenciam o fato que as AP na Amazônia foram criadas para a proteção de espécies terrestres. Apenas duas espécies são consideradas protegidas pela rede de API (Figura 2). Essas espécies são tartarugas que vivem em uma grande diversidade de ambientes, possuindo ampla distribuição. Ao inserirmos as reservas de Uso Sustentável (API+AUS), 13 espécies são protegidas. Nesse cenário, as AP contemplaram no máximo 29% da distribuição potencial de uma espécie. Somente as espécies que possuem distribuição restrita na Amazônia brasileira não foram protegidas no cenário API+AUS. No cenário que considera API+AUS+TI, apenas duas espécies não são protegidas. As espécies consideradas protegidas tiveram entre 27 e 45 % da sua distribuição potencial dentro das AP.


Nós ressaltamos a importância das AUS e das TI na abrangência de padrões de distribuição das tartarugas de água doce na Amazônia brasileira. Tartarugas são muito importantes na dieta das comunidades tradicionais e indígenas da Amazônia, e as reservas de Uso Sustentável e TI são fundamentais para conciliar a conservação de biodiversidade e as necessidades humanas. Entretanto, o uso dos recursos naturais nesses locais geralmente não é supervisionado de forma adequada. Desde sua criação, as AUS perderam muita área devido ao desmatamento e mesmo em áreas onde a cobertura vegetal parece intacta, populações de algumas espécies tem sido erradicadas pela caça. A sobrexploração de fêmeas adultas e ovos de tartarugas de água doce tem sido registrada para muitas populações. Dessa forma, AUS podem não ser eficientes na conservação das espécies exploradas para consumo humano.

A inserção de AUS e TI nas análises foi crucial para quase todas as espécies serem consideradas protegidas.

Camila Kurzmann Fagundes

Por fim, a rede de API não protege a maioria das espécies de tartarugas de água doce da Amazônia brasileira. A inserção de AUS e TI nas análises foi crucial para quase todas as espécies serem consideradas protegidas. Entretanto, nessas áreas, principalmente em AUS, algumas espécies podem ser sobrexploradas. Unidades de Conservação deveriam ser estabelecidas com base em áreas de bacias hidrográficas em toda a Amazônia. A conversão de extensões de terras em AP é um processo complexo. Assim, uma forma mais eficaz de desenvolver um planejamento de conservação para tartarugas de água doce seria selecionar áreas importantes para o grupo próximo de AP já existentes, levando em consideração as necessidades culturais das populações tradicionais.

Artigo original disponível em: http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/ddi.12396/abstract

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