Entrevista: Kirk Winemiller

link
bookmark_border Favoritos

Com sua simpatia e carisma, o professor Kirk Winemiller da Universidade de Texas, destacou pontos chaves que os estudantes de ciências devem ter e nos contou algumas de suas experiências na região tropical.

cover


share Compartilhar expand_more

Revista Bioika (RB): Dr. Winemiller, de onde veio seu interesse pelas ciências ambientais?

Kirk Winemiller (KW): Bom, acho que como a maioria das pessoas, tudo começou quando eu era criança. Acredito que a maioria das crianças tem um fascínio por animais e natureza, e definitivamente eu era uma criança dessas. No entanto, muitas pessoas quando se tornam mais velhas perdem esse fascínio com a natureza, mas algumas pessoas não. Eu acredito que a maioria dos biólogos são pessoas que mantêm esse tipo de curiosidade infantil e fascínio com a natureza. E, também, eu simplesmente amo a biodiversidade e estar no meio da natureza.

RB: Qual a motivação que você teve para pesquisar nos países tropicais?

KO: Bom, novamente, como criança eu sempre fui fascinado pelos trópicos. Por exemplo, eu costumava assistir filmes antigos sobre o Tarzan na África e pensava “que surpreendente a floresta e todos aqueles animais interessantes”. Eu tinha um pequeno aquário de peixes tropicais na minha sala, e então eu lia um monte de revistas, artigos e livros sobre peixes tropicais, e eu sonhava com esses lugares de onde os peixes vinham, o rio Amazonas, o rio Congo, e eu nunca imaginei que eu poderia visitar esses lugares.

 RB: Sabemos que os países latinoamericanos sofrem dos mesmos problemas ambientais, incluindo o descaso dos tomadores de decisão com os resultados alcançados pela ciência. Como você vê o futuro da ciência na América Latina? E especificamente da ecologia?

KO: Eu acho que a pesquisa ecológica, a qualidade e a quantidade de ciência na América Latina têm crescido tremendamente no campo da ecologia. Consequentemente, está fadado a ganhar espaço na arena política. Mas nós podemos fazer coisas para ajudar nesse processo, talvez a sua revista online seja uma dessas coisas que podem ajudar. Mas eu penso que só a qualidade e a quantidade de pesquisa que tem sido feita vai ter algum impacto, e eu sei que existem pessoas que tem uma grande paixão por levar a ciência para a arena política. Alguns professores aqui em Maringá tem tido muito sucesso nisso, então nós precisamos de mais pessoas que façam isso.

RB: Pela experiência que você tem o que poderíamos aprender com os países desenvolvidos? 

KO: Bom, vocês não querem repetir os erros que nós fizemos nos países desenvolvidos. Os padrões típicos de desenvolvimento e impactos no ambiente são que primeiro você tem um desenvolvimento rápido com muitos impactos ambientais, isso aconteceu na Europa talvez lá pelos anos 1700 – 1800, e aconteceu na América do Norte nos anos 1800 e início dos anos 1900. Nós destruímos muitos os habitats e espécies antes das pessoas entenderem a necessidade da biodiversidade e o valor da biodiversidade. Esse impacto aconteceu. Depois, quando o país já está mais desenvolvido economicamente, com mais infraestrutura para educação e ciência, então as pessoas percebem o valor da natureza. Nós criamos, por exemplo, o sistema de parques dos Estados Unidos por volta de 1900, muito tempo atrás, e agora nós temos diversos parques nacionais maravilhosos para proteger. Isso não é dizer que nós não temos impactos, ainda temos muitos impactos, mas o que digo é que parece que há uma evolução da sociedade economicamente desenvolvida, que começa com um alto impacto nos ecossistemas naturais, e quando um grau de riqueza, maior PIB por exemplo, é atingido, a partir daí há um maior investimento em conservação. Então, é muito difícil para um país em desenvolvimento, por exemplo, uma região tropical, podemos pegar a África como exemplo. É difícil nesse caso sair do estado que conhecemos para um estado desenvolvido economicamente onde todo mundo tem prosperidade e ao mesmo tempo conserva a biodiversidade, os recursos naturais, o capital natural. Mas esse é o desafio, é o maior desafio atualmente, encontrar alguma fórmula de passar mais pessoas para um estado econômico melhor sem causar danos aos recursos naturais e à biodiversidade. Eu não tenho uma resposta pra isso, e não tenho certeza que alguém tenha uma resposta pra isso, é um problema muito grande.


 


RB: Como você vê os novos pesquisadores atualmente? 

KO: Eles são muito parecidos com a geração anterior, eu acho que as pessoas são iguais a cada geração. Portanto, sempre há alguns estudantes que são muito apaixonados e comprometidos e continuam na profissão e são muito produtivos. Mas também há algumas pessoas que, infelizmente, perdem seu compromisso ao longo do caminho e não continuam. E nós vemos isso todo dia com os estudantes. Eu acredito que a chave para o sucesso e para a produtividade é paixão e trabalho duro, apenas isso. Você não precisa ser um gênio, como um gênio matemático, eu não acredito nisso. Eu acho que as pessoas que têm sucesso e fazem contribuições são aquelas que têm apenas paixão pelo que fazem.

RB: Quais poderiam ser as contribuições da ecologia para a sociedade atualmente? E quais deveriam ser? 

KO: Contribuições ecológicas? Bom, escolha qualquer problema ambiental que quiser, e nós precisamos da ecologia para ajudar a resolver o problema. Portanto, mudanças climáticas, a implicação das mudanças climáticas para os sistemas naturais, para a biodiversidade, que inclui recursos naturais dos quais os humanos dependem, na verdade a biosfera depende dos organismos vivos: nós não teríamos oxigênio na nossa atmosfera sem as plantas, certo? Então, a biosfera como conhecemos, é um sistema muito complexo e interconectado envolvendo organismos vivos. É isso que a ecologia estuda, ecologia é central, portanto eu provavelmente poderia listar vinte diferentes problemas ambientais onde a ecologia é essencial. Muitos não entendem isso, mas nós precisamos de ecólogos.

RB: Nas aulas você disse que ecologia envolve tudo… 

KO: É tudo: medicina, atmosfera global, produtividade do oceano para a pesca, produtividade florestal. Tudo é ecologia, tudo que é vivo envolve ecologia porque todo ser vivo tem um ambiente e todo ser vivo age em outras coisas vivas. Isso é ecologia.

RB: Você acredita que isso torna a ecologia difícil? 

KO: Sim, a Ecologia é uma ciência difícil. Não é para pessoas medrosas. Algumas pessoas acreditam, por exemplo, que a Astrofísica é um campo muito complexo na ciência, ou a Neurofisiologia, ou a Genética, que são muito complexas ou difíceis. Eu diria que a Ecologia é igualmente difícil. Nós lidamos com grande complexidade, grande variação e os sistemas que estudamos têm grande complexidade e o nosso desafio é simplificar essa complexidade em uma forma que nós possamos fazer previsões bem sucedidas. Portanto é um grande desafio. Mas isso que a torna interessante. Tudo que é fácil de entender, fácil de demonstrar, não seria interessante.

RB: Quais as ferramentas ou características que você julga importante para a formação de um ecólogo?

KO: Eu acho que já disse: paixão, eles precisam ser apaixonados com o que eles estão estudando ou estão tentando aprender, e trabalho duro. Disse antes e digo novamente: paixão e trabalho duro.

RB: E a estatística?

KO: Ah, qualquer um pode aprender matemática. Muitos estudantes, jovem estudantes me diriam: “Poxa, eu não sou muito bom em matemática”. E eu digo que isso é ridículo, todo mundo pode aprender matemática. É apenas lógica e o cérebro humano é designado para ser lógico. É claro que algumas pessoas têm um ótimo talento para a matemática, mas todo mundo pode aprender matemática. É apenas uma questão de atitude: se você diz a si mesmo que não é bom nessa atividade, então provavelmente você não será bom. Então não diga a você mesmo essas coisas. Essa é a chave.

RB: Você pode destacar alguns pontos marcantes de sua carreira, especialmente na América Latina? 

KO: Bem, um dos meus projetos de pesquisa favoritos foram os levantamentos que fizemos no rio Cassiquiari, no interior da Venezuela. Foi uma série de expedições, essa foi a melhor experiência de toda a minha vida porque participar dessas expedições era como voltar no tempo, porque essa região era tão remota, não havia infraestrutura, pouquíssimas pessoas vivendo na região, só algumas aldeias indígenas. Então você pode imaginar, quando você está nesse tipo de expedição, que você na verdade poderia estar nos anos 1800, como Humboldt, a região se parece exatamente a mesma do que a da época dele, a mesma experiência de Humboldt.... Isso é maravilhoso, é muito raro encontrar esse tipo de ambiente. Existem tantas pessoas no planeta hoje, tanto desenvolvimento, que ter aquela oportunidade pra mim foi simplesmente fascinante. Eu tive uma experiência parecida com minha esposa na África, nós éramos recém-casados e fomos para a Zambia para trabalhar com ecologia trófica e de pesca no rio Zambazia, e aquela foi uma experiência extraordinária, similar àquela que descrevi no Cassaquiari. Então, essas pra mim foram as minhas experiências favoritas das quais tenho em mente, por causa dos lugares e da biodiversidade únicos, uma biodiversidade maravilhosa, e eu espero que as pessoas no futuro não percam essas oportunidades, que as próximas gerações possam experienciar lugares assim.

Você pode conhecer mais sobre o trabalho deste incrível pesquisador no site do seu laboratório, acesse: https://aquaticecology.tamu.edu/


Isso foi útil?


library_booksVersão PDF



event_available Lançamentos

alarm_onNotificações

close bookmark_border Favoritos