A região amazônica é um dos locais mais importantes do mundo, pois abriga a maior floresta tropical e um dos maiores rios do planeta. Essa região é habitat de milhares de espécies de peixes de água doce e reconhecida pela sociedade e pela comunidade acadêmica como uma região que sofre constantemente com diversos impactos negativos causados pelos humanos, tais como, a pesca ilegal e desordenada, a construção de barragens, mineração, queimadas, desmatamento ilegal, entre outros. É inegável que a relação do ser humano com a natureza está longe do ideal e da sustentabilidade. Há cada vez menos fiscalização efetiva, e um amplo boicote aos órgãos ambientais públicos, os quais vêm amplificando a destruição das florestas e dos rios em território nacional. Entretanto, alguns problemas são mais evidentes e ganham as manchetes dos jornais e revistas, enquanto outros impactos negativos estão longe dos olhos da mídia e se tornam ameaças silenciosas. A ameaça da vez são as espécies exóticas, que são espécies introduzidas em outros locais fora da sua área de ocorrência natural. Elas representam um risco para a biodiversidade aquática, para a dinâmica do complexo ecossistema amazônico e para a segurança hídrica regional.
A maioria destes peixes chegam ao ambiente natural através da aquicultura, como por exemplo a tilápia do Nilo Oreochromis niloticus, espécie dominante nos cultivos e que já tem seus impactos negativos aos ecossistemas exaustivamente documentados. Ela também possui um amplo incentivo na legislação de alguns países como o Brasil e a Bolívia, que estimula seu cultivo e torna o cenário ainda mais complexo.
Um caso particular da região envolve o pirarucu (Arapaima gigas), nativo da planície da bacia hidrográfica do rio Amazonas, mas foi introduzido como peixe de cultivo na Bolívia e no Peru. Houve escapes desta espécie de peixe para os rios, como acontece com a maioria das espécies exóticas e assim ela se espalhou para várias bacias na região onde não ocorre naturalmente, como a do rio Madeira. Muitos dos peixes encontrados também são de interesse comercial na aquariofilia, e podem acabar sendo despejados nos rios por diversos motivos.
Os pesquisadores apontaram um aumento ainda mais acentuado nos registros de ocorrência e de novas espécies exóticas na região amazônica nas duas últimas décadas. Mais de 1314 indivíduos de 41 espécies exóticas de peixes foram identificadas na bacia amazônica. Esses números são preocupantes e podem indicar que, apesar de a região amazônica ainda possuir áreas bastante conservadas, aos poucos as alterações humanas estão disseminando as espécies exóticas, as quais estão alterando esse ambiente único e tão importante para o planeta. Além de ser uma fonte de impactos significativa para a biodiversidade aquática, as espécies exóticas também causam impactos econômicos e sociais para as comunidades tradicionais, que dependem da pesca artesanal. Essas espécies podem causar redução nas populações de peixes nativos, desequilíbrio na cadeia alimentar e até mesmo levar outras espécies endêmicas à extinção.
Um dos principais problemas é que, ao contrário das espécies nativas, as exóticas geralmente são mais bem adaptadas, e resistem às alterações e impactos ambientais. Dessa forma, elas tendem a competir de forma superior, especialmente em longo prazo, com os peixes nativos. O resultado destas alterações são a perda de biodiversidade e de serviços ecossistêmicos, e ainda o comprometimento da segurança hídrica e alimentar da região. Outro agravante é que, dada a complexidade da região amazônica e a dificuldade de acesso para estudos, podemos estar perdendo recursos naturais que sequer sabemos da existência ou da importância para o ecossistema.
As soluções para estes problemas dependem de investimentos relevantes e integrados dos governos em fiscalização, monitoramentos, pesquisas, conservação e manejo na região amazônica. Enquanto houver negligência nestas áreas e um interesse direcional em favorecer apenas determinados setores da economia, sem considerar os princípios básicos de sustentabilidade e os riscos ambientais, estaremos nos aproximando cada vez mais de um beco sem saída, onde a Amazônia e seus preciosos recursos naturais poderão se tornar um deserto monotônico e inóspito.
Artigo original disponível em: https://doi.org/10.3389/fevo.2021.646702