Seria possível uma soberania alimentar?

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A fome no mundo aumentou desde 2014. Uma reflexão sobre o papel dos camponeses na conquista da soberania alimentar.

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Um soberano alimentar. Imperador Rodolfo II como Vertumnus  por Giuseppe Arcimboldo. O acesso a uma alimentação adecuada passa por enfrentar as ameaças das mudanças climáticas e da pandemia COVID-19 que levou milhões à pobreza.

A alimentação é considerada um direito humano em vários acordos e declarações internacionais, como o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; a Declaração Universal dos Direitos Humanos e, por fim, a Observação Geral do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais1. No entanto, embora várias constituições políticas consagrem esse direito, milhões de pessoas sofrem de fome e desnutrição, situação que foi agravada pelo surgimento da pandemia COVID-192.

Com resultados muito limitados, mas notórios, a discussão na esfera política muitas vezes se limita a ver o problema alimentar individualmente e não como um conjunto de fatores que interagem, tais como pobreza, fome, desnutrição, desigualdade, educação, mudanças climáticas e destruição da natureza. O resultado é que a crise alimentar está atingindo novas dimensões.

Estima-se que a população mundial atingirá 8,5 bilhões até 2030, resultando em um aumento no número de pessoas que sofrerão com a fome em várias regiões do planeta. Um estudo realizado em conjunto pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), a Organização Mundial da Saúde (OMS), entre outras, estimou que até 2030 quase 67 milhões de pessoas serão afetadas pela crise alimentar na América Latina e no Caribe. Tal cenário é possível mesmo considerando que o combate à fome é um objetivo atual nos acordos políticos globais para o desenvolvimento sustentável3.

Nas últimas décadas, as organizações internacionais estiveram em alerta devido às limitações dos modelos de produção atuais, que impedem a garantia do direito à boa alimentação. Em resposta a isso, tem sido proposto um novo modelo de soberania que visa redesenhar os sistemas de produção atuais. Micarelli4 destaca que atualmente a segurança alimentar tem como foco a disponibilidade e o acesso aos alimentos, porém, para garantir a soberania alimentar dos territórios o ideal seria levar em conta quem produz e como os alimentos são produzidos.

Alguns países desconhecem o importante papel dos agricultores e camponeses, apesar de serem eles quem têm conhecimento para gerir os sistemas de produção de alimentos. Hoje, os agricultores são afetados pelo aumento de impostos, enquanto a assinatura de acordos de livre comércio abastecem os mercados nacionais com produtos importados de países desenvolvidos. A junção desses fatores ameaça a sustentabilidade da agricultura nacional tradicional nos países produtores e coloca em risco sua economia, influenciando na crise alimentar que atinge o mundo.

Fazendeiro cultivando cacau

O objetivo da soberania alimentar deve ir além do acesso aos alimentos e adotar uma nova abordagem do problema global da alimentação5, pois esta deve representar, ou melhor, priorizar a produção agrícola nacional para alimentar a população. Para tanto, é necessário o apoio de entidades governamentais. Que sejam essas entidades as responsáveis pela articulação das políticas estabelecidas nos planos de desenvolvimento, na medida do possível com enfoque na sua diversidade geográfica e cultural, pois é no campo onde se encontra a oportunidade de gerar os alimentos que a nossa sociedade necessita.

A situação atual é, de fato, desanimadora e pode ser pior nos países em desenvolvimento, os quais buscam um avanço industrial que traz consigo múltiplos impactos que agravam a crise alimentar interna. As políticas estão centradas em uma doutrina econômica que deixa de lado o desenvolvimento agrícola, ao mesmo tempo que regula a liberdade política agrária, o que leva os povos à perderem o poder de produzir seus alimentos e mina sua soberania alimentar.

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Para mais informações:

  1. Maria Alejandra Ramírez Galvis, M. A. 2019. Vivir sin hambre en Colombia. El derecho humano a la alimentación desde una perspectiva de soberanía alimentaria en Colombia [Universidad Santo Tomás]. https://repository.usta.edu.co/handle/11634/17585
  2. Christoph Hasselbach. 2020. COVID-19 agudiza el hambre en el mundo. El Mundo. https://www.dw.com/es/covid-19-agudiza-el-hambre-en-el-mundo/a-55250116
  3. FAO. 2020. ONU: El hambre en América Latina y el Caribe podría afectar a casi 67 millones de personas en 2030. Organización de Naciones Unidas Para La Alimentación y La Agricultura. http://www.fao.org/americas/noticias/ver/es/c/1297774/
  4. Giovanna Micarelli. 2018. Soberanía alimentaria y otras soberanías: el valor de los bienes comunes. Revista Colombiana de Antropología, 54(2), 119–142.
  5. José Luis Carmona Silva, Lizbeth Sánchez Flores, José Aurelio Cruz De los Ángeles, R. S. 2020. ¿Es posible una soberanía alimentaria en México? RICSH Revista Iberoamericana de Las Ciencias Sociales y Humanísticas, 9(18), 40–69. https://doi.org/10.23913/ricsh.v9i18.210


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