Biodiversidade: a vida em suas diferentes formas

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O termo biodiversidade é amplamente utilizado na ciência, nos jornais, nas redes sociais. Mas o que exatamente ele representa? Ela é estável, ou seja, está sempre igual? Como saber se a “diversidade biológica” está sofrendo grandes perdas?

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Reserva Forestal Adolpho Ducke, em Manaus, Brasil

Quando ouvimos sobre florestas tropicais, somos facilmente levados a imaginar ambientes extremamente ricos em recursos naturais, como a exuberante Floresta Amazônica e seus belos rios, com árvores enormes e centenárias cheias de animais coloridos e exuberantes. Um ambiente repleto de biodiversidade! Mas como interpretar essa biodiversidade? Como os pesquisadores conseguem medir toda a biodiversidade existente nos ambientes? E como eles sabem quando a biodiversidade está sofrendo alterações?  

De acordo com o dicionário, biodiversidade é “o conjunto de todas as espécies de seres vivos existentes em determinada região ou época”. Essa definição pode parecer bem indutiva, entretanto, na prática, acaba sendo complicado “medir” esse conjunto de seres vivos. Será que essa medição da biodiversidade é feita pelo número de espécies diferentes que vivem em um determinado lugar? Ou a contagem é feita através dos indivíduos de uma mesma espécie em um espaço delimitado? Ou ainda, como considerar esse conjunto de espécies animais e vegetais presentes em uma área? 

Aquarelas do naturalista suíço Jacques Burkhardt

A busca por respostas para essas perguntas intriga os estudiosos da natureza desde os mais remotos tempos. Os naturalistas já tentavam entender como as espécies se distribuíram pelo planeta e como os ecossistemas funcionavam. Perguntas sobre como o tempo e o espaço geográfico definem as espécies que sobrevivem em determinados lugares, sobre como a temperatura, a umidade e a luminosidade permitem a existência de algumas espécies em certos ambientes, mas não de outras, assim como questionamentos sobre o que exatamente controla a diversidade das espécies, ainda hoje, são grandes questões que os pesquisadores buscam explicar.

O primeiro aspecto a se pensar é que a biodiversidade não é uma estrutura fixa. Ela é influenciada por fatores ambientais e é modificada ao longo do tempo a partir de relações existentes entre os organismos vivos, como a predação e a competição. As migrações também são importantes processos que modificam constantemente a biodiversidade. Elas são movimentos de entrada e saída de indivíduos ou grupos de indivíduos pelos espaços geográficos, podendo ser migrações temporárias ou permanentes. Ocasionadas geralmente pela busca por recursos para a sobrevivência, como alimentos, temperaturas mais favoráveis ou reprodução, essas alterações atuam diretamente no funcionamento dos ecossistemas e modificando a biodiversidade dos ecossistemas.

A biodiversidade não é uma estrutura fixa. Ela é influenciada por fatores ambientais e é modificada ao longo do tempo a partir de relações existentes entre os organismos vivos, como a predação e a competição

Muitas abordagens foram desenvolvidas para tentar mensurar a biodiversidade e todas essas relações existentes entre os organismos. Uma importante tentativa de quantificação foi desenvolvida pelo estatístico e naturalista britânico Sir Ronald Aylmer Fisher, que ao perceber diferenças existentes na abundancia das espécies, desenvolveu um modelo matemático para tentar explicar essas variações1. A partir desse estudo, diversos trabalhos começaram a ser realizados visando aprimorar e melhorar os modelos de medição da biodiversidade, sempre tentando responder a famosa pergunta biológica: como quantificar as diversas vidas existentes no planeta? 

Conseguir entender as relações entre os seres vivos e quantificar a biodiversidade é extremamente importante porque eles atuam como indicadores da qualidade ambiental dos sistemas ecológicos e possibilitam a comparação entre diferentes ambientes. Alterações na biodiversidade modificam o estado natural dos ecossistemas acarretando problemas e desequilíbrios ambientais por todo o planeta2

O método mais simples de quantificação da biodiversidade consiste na contagem do número de espécies em uma determinada área, chamada riqueza de espécies. Entretanto, esse tipo de contagem faz com que todas as espécies sejam equivalentes naquele ambiente, desconsiderando, por exemplo, importantes características relacionadas à reprodução, deslocamento, alimentação ou, até mesmo, a função que cada espécie exerce na natureza. Isso fez com que os pesquisadores percebessem que esse tipo de medida não era suficiente para definir toda a complexidade envolvida na natureza, além de não conseguir responder como as espécies se relacionavam entre si e com o ambiente.

Foi Evelyn Pielou3, uma ecóloga canadense, quem propôs alguns índices matemáticos para a quantificação da biodiversidade a partir das diferenças existentes entre as espécies e a função que cada espécie desempenha no ambiente. Atualmente, os índices de quantificação da biodiversidade relacionam a contagem do número de espécies, o modo como acontece a distribuição dessas espécies pelos ambientes e ainda, como são as relações e interações existentes entre as diferentes espécies: 

Quando alguma espécie desaparece daquele ecossistema, o ambiente fica desequilibrado, pois não existe nenhuma outra espécie que consiga desempenhar a função daquela espécie que sumiu.

Pensando no funcionamento de uma floresta, podemos observar como as diferentes espécies de animais que vivem ali se alimentam, por exemplo.  Considerando que algumas espécies se alimentam de folhas, enquanto outras se alimentam de frutos e outras ainda se alimentam de pequenos insetos, percebemos que cada espécie realiza uma função específica na floresta. 

Evelyn Chrystalla (Chris) Pielou

Portanto, quando alguma espécie desaparece daquele ecossistema, o ambiente fica desequilibrado, pois não existe nenhuma outra espécie que consiga desempenhar a função daquela espécie que sumiu, fazendo com que a floresta tenha o seu funcionamento alterado e sua diversidade de funções diminua, tornando esse ambiente cada vez mais vulnerável. 

Características evolutivas, genéticas e de graus de parentesco entre as diferentes espécies existentes também estão sendo cada vez mais utilizadas para ajudar no entendimento sobre a biodiversidade. Esse tipo de informação considera a história evolutiva das espécies para responder como ocorreu a distribuição dos organismos pela Terra ao longo do tempo. Além de ajudarem na identificação de importantes eventos históricos que moldaram as características físicas e biológicas do planeta, esses índices também informam sobre o risco de extinção a que as espécies estão submetidas4

Pensando novamente no funcionamento de uma floresta e nos graus de parentesco que as espécies apresentam entre si, percebemos que ambientes com espécies pertencentes a muitos gêneros diferentes apresentam também, maior diversidade quando comparados a ambientes que possuem as espécies pertencentes a um mesmo gênero. Essa diferenciação existente entre os grupos de espécies ajuda a manter a diversidade genética no ambiente e, consequentemente, a maior biodiversidade. Portanto, garantir que os ecossistemas apresentem a maior diversidade genética possível é importante porque, caso ocorra a extinção de alguma espécie daquele local, a perda de biodiversidade acaba sendo menor4

Esse olhar para a biodiversidade envolvendo abordagens distintas ajuda os pesquisadores a entenderem como ações humanas como desmatamento, queimadas, poluição, uso desordenado de agrotóxicos e produtos químicos, urbanização acelerada e má utilização de recursos naturais como a água e o solo estão causando a extinção das espécies e alterando o funcionamento de importantes áreas naturais. Entender como a biodiversidade vem sendo modificada cada vez mais rapidamente por ações humanas é fundamental para a realização de mudanças frente à crise climática e para o desenvolvimento de práticas mais sustentáveis, criação de políticas de conservação, manejo e monitoramento ambiental, intensificação da legislação para proteção de áreas preservadas e para o desenvolvimento de projetos socioambientais5. Dessa forma, entender a biodiversidade a partir de seus variados aspectos é fundamental para cuidarmos de maneira saudável e responsável de todas as formas de vidas existentes no planeta!   

Referências

  1. Antônio C. da S. Zanzini. (2005). Descritores Quantitativos de Riqueza e Diversidade de Espécies. Universidade Federal de Lavras. Fundação de apoio ao Ensino, pesquisa e extensão - FAEPE. Lavras, MG. 44p.
  2. Anne E. Magurran. (1988). Ecological Diversity and its measurement. Princeton, Newjersey, l79p.
  3. Evelyn C. Pielou. (1975). Ecological Diversity. New York: Wiley.
  4. Marcus V. Cianciaruso et al. (2009). Diversidades filogenética e funcional: novas abordagens para a Ecologia de comunidades. Biota Neotropica, 9, 3, 93–103.
  5. Brasil. (2019). Relatório Temático: Potência ambiental da biodiversidade: um caminho inovador para o Brasil/ Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos. Disponível em: https://www.bpbes.net.br/produto/mudancas-climaticas/ 

Mais textos legais abordando sobre índices de diversidade:

  1. Joedison dos S. Rocha. 2019. Diversidade funcional: um olhar para a identidade da biodiversidade. Mais um Blog de Ecologia e Estatística. Disponível em: https://anotherecoblog.wordpress.com/2019/02/18/diversidade-funcional-um-olhar-para-a-identidade-da-biodiversidade/
  2. Elder Sodré. 2013. Diversidade funcional: entendendo o funcionamento dos ecossistemas a partir de uma nova abordagem. Limnologia UFRJ. Disponível em: https://limnonews.wordpress.com/2013/08/15/diversidade-funcional/

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