A expansão da agricultura, especialmente das monoculturas, tem causado uma grande perda de biodiversidade em todo o mundo. No entanto, as reservas privadas (no Brasil mais conhecidas como Reserva Particular do Patrimônio Natural- RPPN) em regiões tropicais têm se mostrado uma solução importante para preservar plantas e animais. Nas planícies da bacia do rio Orinoco, esse tipo de iniciativa também está ajudando a proteger diversas espécies de morcegos.
As planícies da bacia do Orinoco, localizados entre a Colômbia e a Venezuela, são ecossistemas ricos em biodiversidade, mas que enfrentam ameaças devido ao avanço da agricultura. São poucas as áreas oficialmente protegidas, e muitas comunidades locais dependem desses ecossistemas para sua sobrevivência. Atualmente, há cerca de 90 espécies de morcegos na região, o que representa uma parte significativa da diversidade desse grupo de mamíferos. Os morcegos desempenham um papel essencial no meio ambiente, como a polinização de plantas, a dispersão de sementes e o controle de insetos.
Dois estudos recentemente publicados nas revistas Biodiversidade e Conservação (Biodiversity and Conservation) e Conservação Animal (Animal Conservation), desenvolvidos por vários pesquisadores, entre os quais Aída Otálora Ardila e Fábio Farneda, autores desta resenha, mostram como as RPPN’s ajudam a conservar os morcegos das planícies da Orinoquia. Essas pesquisas foram realizadas em colaboração com outros cientistas como Carolina Gómez Posada do Instituto Humboldt, Jaime Polanía e Hugo López Arévalo da Universidade Nacional da Colômbia e Christoph Meyer da Universidade de Salford, no Reino Unido. Como parte do estudo, foram capturados 996 morcegos em diferentes tipos de habitats, incluindo florestas, savanas e plantações de arroz.
Os resultados mostraram que as RPPN’s são fundamentais para manter a diversidade dos morcegos e garantir que eles continuem desempenhando seu papel na natureza. Enquanto os morcegos frugívoros (que se alimentam de frutas) conseguem se adaptar melhor às áreas modificadas pela agricultura, espécies com dietas mais especializadas, como as que se alimentam de insetos ou pequenos animais, são mais vulneráveis e só foram encontradas dentro das reservas protegidas.
Essa pesquisa indica que compreender como as características dos morcegos interagem com seu ambiente pode ajudar a prever como eles responderão a futuras mudanças no uso da terra. Se a degradação ambiental nas planícies da Orinoquia continuar, muitas espécies de morcegos poderão estar em risco de extinção. Um exemplo destacado nos estudos é o morcego insetívoro (Micronycteris minuta), que se beneficia da conservação das florestas ripárias nas reservas privadas. Esse morcego ajuda a controlar as populações de insetos herbívoros e é mais abundante dentro das reservas.
As pesquisas que temos liderado destacam que as RPPN’s nas planícies da Orinoquia são essenciais para proteger a biodiversidade e garantir a sobrevivência dos morcegos. Apesar da falta de apoio governamental na Colômbia e na Venezuela, os proprietários das RPPN’s conseguiram proteger ecossistemas importantes para muitas espécies. Para fortalecer esse trabalho, especialistas sugerem incentivos financeiros para a conservação e a promoção de práticas agrícolas mais sustentáveis. Além disso, as RPPN’s oferecem esperança ao demostrar que a preservação de parte da vegetação nativa permite reverter alguns dos efeitos negativos da agricultura em larga escala. Para proteger o futuro das espécies de morcegos mais sensíveis à transformação da paisagem, é fundamental implementar políticas de conservação mais robustas que apoiem e expandam as reservas privadas.
Proteger os morcegos das planícies da Orinoquia não é importante apenas para as áreas rurais, mas também para quem vive nas cidades. Esses animais ajudam a controlar pragas, como alguns mosquitos que podem transmitir doenças e afetar a saúde pública. Além disso, são essenciais para a polinização de plantas e a produção de alimentos. Portanto, cuidar dos morcegos em ambientes rurais é uma forma de melhorar também a qualidade de vida nos centros urbanos.
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Para mais informações:
- • Farneda FZ, Otálora-Ardila A, Meyer CFJ, López-Arévalo HF, Gómez-Posada C, Polanía J. (2024). Multiple dimensions of phyllostomid bat biodiversity across ecosystems of the Orinoco Llanos. Animal Conservation 27, 659-670. https://doi.org/10.1111/acv.12941
- • Otálora-Ardila A, Farneda FZ, Meyer CFJ, López-Arévalo HF, Polanía J, Gómez-Posada C. (2024). Trait-mediated filtering predicts phyllostomid bat responses to habitat disturbance in the Orinoco Llanos. Biodiversity and Conservation 33, 1285-1302. https://doi.org/10.1007/s10531-024-02792-2

